Trato (I)Mortal

sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Texto feito em parceria com Lucas L. Rocha

Tu te enxergas como uma fortaleza, rocha incapaz de quebrar. Acumulaste total prepotência, e agora, diante de mim, suplicas por um fio de ar para respirar. Ora, onde está a autoridade daquele que, por tantas vezes, fez questão de mostrar-me aos outros da pior maneira possível? Aqui estás, diante e perante mim. Esperando pela minha plena chegada, intercedendo pelo dissipar da dor que sentes. Entretanto, proporcionar-te-ei o veneno que espalhaste por tantas vidas: a morte.

Como dói tudo o que sinto! Não meu corpo, mas sim minha consciência. Todo o mau que causei parece ter voltado para mim de uma única vez, dilacerando minha alma em fragmentos incandescentes e cada vez menores, que corroem minha incômoda existência. Mas amo a vida, mesmo que tenha tirado tantas com essas mãos ainda manchadas de sangue. É por isso que peço: tenha piedade! Meus risos sádicos de prazer ao sentir aquele líquido rubro em minha pele não existem mais. Tudo o que sinto é arrependimento, e suplico uma nova chance para fazer tudo de uma outra forma.

Ora, o que achas que me levaria a livrar-te de toda a culpa e punição que deves receber? Nada. Não há perdão, meu caro. Tudo o que fizeste aos outros, agora, chega perto de ti. O riso sagaz, o prazer de ver o sangue manchar-te as vestes, a sensação de poder nas mãos... A autoridade ao ver a súplica patética da vítima. O gosto amargo do perigo chegará aos seus lábios, e eles secarão. Lembrarás de todos os males que fizera e, agora, perceberás a verdadeira intensidade daquilo que tanto desprezava. Porém, não se atordoe. Morrer é apenas abster-se da luz. Morrer não dói.

Não dói porque você já está morta! Veja bem e pense sobre o que você está fazendo! Não somos assim tão diferentes, somos? Na verdade, somos até parecidos demais. Muitas vezes fui você, e tive o mesmo prazer que agora você tem ao me atormentar. O que acha de, em lugar de tirar minha vida, fazermos um trato?! Serei você, trabalharei para você por quanto tempo for necessário. Será Morte, e eu morte. Seremos apenas um, lutando por um único ideal e propósito! Não é genial? Serei seu capacho, matarei qualquer um que ordenares, de um ínfimo mendigo ao presidente do país. Farei o que for necessário, minha doce e cruel inimiga. Só não me mate!

Ora, ora... Estás a me propor um trato, certo? Na verdade, devo confessar que me parece plausível e um tanto quanto tentador, ainda que eu prefira reinar plena e absolutamente. Mas, confesso, também, que a proposta de ser mandante me fascina e muito. Enfim, combinado, então. Serei Rainha e você, súdito. Farás as minhas vontades e trabalhos sem queixar-se, entretanto, não se esqueça: Estarás vivo, porém controlar-te-ei... – Sofrerás em minhas mãos tudo o que sofreram nas tuas... Farei da tua própria saliva, um veneno diário. Afinal, ainda que tenha aceitado o trato, tenho de me embebedar com o sofrimento alheio. Ossos do ofício. – Espere e verás o meu primeiro sinal. Não se exalte com a minha possível demora. Enfim, apenas espere. Hasta la vista, baby!

Espere! Antes que vá, apenas quero agradecer-lhe। Obrigado, senhora, e a partir de agora dona. Serei seu capacho, como bem desejas, e sei que irei gostar do novo trabalho. Agora, apenas uma pergunta: já posso começar?

Por: Julya Tavares - Prazer, a morte.


2 comentários:

Lucas L. Rocha disse...

Prazer, Lucas: o frio assassino cagão


;)

Lucrécio Arrais disse...

Um texto grande porém gostoso de ler. :)

Eu dei uma repaginada no meu blog, se quiser ir dar uma conferida...

Beijos!